domingo, 25 de março de 2012

Emiliano

Emiliano era como um rochedo, impenetrável e duro, não se deixava levar por nenhum tipo de lamúria, tristeza ou mesmo felicidade passageira.  Às vezes, ficávamos juntos perto do rio e conversávamos sempre sobre várias coisas, e era onde Emiliano me deixava claro seus objetivos quanto à catequese. “Laura, ainda me caso com ela e a farei dona do mundo”, dizia ele. Quando declamava os versículos da bíblia, nas aulas de catequese, era como um poeta das ruas ao declamar suas injúrias, empastelado de amor e de sossego aparente. E eu me recolhia em meu mundo tentando decifrar o dele, aquele mundo em que meu grande amigo parecia um rei, cheio de certezas e de desmandos, como se tudo ao seu redor funcionasse como queria a sua vontade, sem que ele precisasse dizer uma palavra em alto. Nas missas, ficava ao meu lado observando Laura, como quem vigia, e me relatava todos os seus movimentos, baixinho, para não atrapalhar o sermão. Há pessoas que o mundo parece gostar mais do que as outras, que as vontades parecem fazer parte do movimento insólito dos dias, que as manhãs encouram de pudor e de virtudes e que todos os problemas parecem lampejos de um mal estado dos nervos. Emiliano, que morrera à pouco mais de dez anos, era como um amante de uma vida que pendia entre a virtude e o desejo incontrolável de ser único, e o era, na medida em que habita a pouca vida que ainda me resta, com sua voz sincera de sonhos e de uma quase inesquecível infância.

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