domingo, 24 de julho de 2011

Lembrança

Olhando a cachoeira derramar nas pedras todas as suas perguntas infantis e ver que elas (as pedras) respondem silenciosamente como uma velha esposa desiludida. Vendo as nuvens anunciar a sua chegada, aos gritos, convidando todos os homens a entrarem quietos em suas casas feitas de palha.  Testemunhando os urubus – ah os urubus – que indicavam, naquela tarde triste, os cadáveres precisados do socorro dos animais comedores de carne. Observando os canários dançando sapecas, sob os cuidados das mães árvores, a sua dança desentendida das conjunturas do mundo animal e se comunicando, por meio de pios, com o joão-de-barro, único possuidor da tão sonhada casa própria. Olhando para a garça, exibida, desfilando no raso do rio a sua beleza lenta, orgulhosa por ter as mais belas pernas do pantanal. Havia também pescadores, longe, tarrafiando em seus barcos de pau o sustento dado aos pobres estomagozinhos pardos, que brincam todos os dias nos campinhos de terra dos vilarejos perdidos no mato. Olhando tudo isso, lembro-me, sentado na ponta de um velho pedaço de madeira, da tua imagem diminuindo de tamanho. Seus cabelos enrolados dançavam com o vento e você me deixava, mas uma vez, sem as tuas necessárias palavras de afeto.

3 comentários:

  1. confesso-lhe, ramiro, que não leio seu blogue com a frequência que gostaria, mas é sempre bom chegar aqui e me surpreender. e a surpresa vem não de certa superação de expectativas, pois isso pressuporia algum tipo de subestimação, mas do encantamento de me deparar com palavras. palavras bonitas, que fazem sentir, no entrementes da consciência aguda e da sutileza, de modo simples, e por isso mesmo cativo, terno. e como consequência até óbvia, palavras que sugerem vida.

    muito bacana!

    saudações poéticas, meu caro.

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  2. É muito bom ver comentários no blogue. Melhor ainda, comentários tão importantes como esse, que é o seu.

    um grande beijo.

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  3. Que coisa linda, meu deus.

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