segunda-feira, 11 de julho de 2011

O labirinto e a rosa

           O mercado municipal estava cheio por causa do aniversário da cidade e o homem, sentado no banco do outro lado da rua, perambulava no interior de si mesmo, perdido no seu próprio labirinto – aquele que se constrói na medida em que lidamos com situações novas e que vai se complicando junto às experiências que fazem envelhecer.
 Procurava dentro de si, sem muita expectativa, alguma idéia sobre o que comprar para Laura, sua namorada há dois anos e meio.
“O que posso comprar com cinco reais?” – pensava.
Sentia-se como um poeta em processo de depravação criativa. As idéias desviavam-se dos seus movimentos como quem pode prevê-los, e ainda sorriam para ele fazendo fusquinha. “Por que é que temos de ser criativos no amor? Não basta o sermos no trabalho, com os amigos e com o público frente ao qual representamos todos os dias?” – perguntava para si mesmo numa tentativa frustrada de justificar a sua indiferença àquilo que concebia como “amor”.
– Olá, amigo, posso ajudá-lo – perguntava, de repente, outro homem, cujo espírito solidário refletia-se nos seus olhos castanho-escuros e cujas roupas brancas e largas indicavam algum pseudo-contato com um mundo sem muitos conflitos materiais.
– Não sei se pode.
– Por que não tenta?
– Não se preocupe, não é nada.
– Vejo que passava por um conflito aí dentro de sua cabeça, estava falando sozinho.
– Amigo, eu agradeço a sua preocupação, mas os conflitos que se passam na minha cabeça são problemas que preciso me livrar sem a ajuda de terceiros, portanto, peço que não se preocupe comigo e vá viver sua vida de santo em paz.
– Então tome essa rosa, talvez ajude. Encontrei-a numa roseira dentro do quintal de uma dessas casas de jardim, dentro das quais o mundo não parece tão complicado como esse que se apresenta, agora, na nossa frente – disse o homem, saindo devagar.
“Porque é que eu não pensei nisso antes? Uma rosa, tão simples” – refletia novamente o homem, encerrando o diálogo consigo mesmo.
Levantava-se de sobressalto e dirigia-se ansioso para o carro, segurando firme a rosa vermelha e indiferente à dor leve causada pelos espinhos. Pisava fundo no acelerador a ponto de sentir, embora calçando os velhos sapatos de camurça, a quentura do asfalto na sola dos pés. Corria aloprado pela cidade sem dar tanta importância ao alvoroço das buzinas. Passava os sinais vermelhos sem perceber até chegar, numa freada brusca, em frente a uma casa de portão verde-claro. Lá, avistava Laura usando seu vestido de cor singular, parecia de ferro chumbado, e pegava a rosa em cima do painel do carro.
– Olha o que eu trouxe – dissera, dirigindo-se a ela com a rosa em uma das mãos.
– Uma rosa – identificava a moça, parecendo não se surpreender muito.
– Para mostrar-lhe o quanto gosto de você.
– Parece que está meio murcha.
– Pode ter ficado assim por causa do sol, deixei-a em cima do painel do carro enquanto vinha para cá.
– Achei linda, obrigada.
Os dois se beijavam tímidos. O homem olhava para Laura e via que seus olhos estavam parcialmente encobertos pelas pupilas, como quem havia acordado há pouco tempo e tinha o pensamento longe, ainda no sonho interrompido pela necessidade de acordar.  Enlaçando-a pela cintura, acompanhava o andar lento da moça para dentro da casa. Via que Laura entrara no quarto com a rosa e, ao sair, não a segurava nas mãos. “Talvez tenha guardado no criado mudo”, pensava. Depois disso, preferira esvaziar a sua cabeça, deixando que o silêncio que pairava entre os dois, na hora do jantar, respondesse a todas as perguntas perdidas naquele estúpido labirinto, que acabara de tomar uma nova forma.

2 comentários:

  1. O senhor realmente leva jeito, já tentou um livro?

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  2. Ainda não. Acredito que ainda há pouca literatura para tanto. Penso em começar com algumas publicações pequenas, mas não conheço ainda nenhum local para publicar. Mas muito obrigado pelo elogio e pelo incentivo. É muito bom ver que o produto que me saem das mãos tem algum significado. Peço que continue acompanhando o blog e que aproveite o melhor que puder.

    Saudações!

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